quarta-feira, 29 de julho de 2015

Em que lugar?



Lucía Tugeiro de Paula Borralho



( poema feito pelo minha poeta de apenas 07 anos, minha petiz Lucía, no quinto dia de expedição nas trilhas da Estrada Real, entre Santa Barbara_Barão dos Cocais_Caeté_Sabará).



Em que lugar?


Ali eu não vou e nem volto
A minha alegria do olhar
Está no meu gritar
E assim vou falar:
_ o que tem com você?
É só dizer...
Não sou nenhum monstro
E nem um pesadelo
Só sou um olhar
Que vem do bla bla bla
Fale logo, antes de eu crescer
Não acorrente suas tristezas
Somente num olhar

terça-feira, 7 de julho de 2015

O aniversário



Acontece sempre nos meses de julho quando se dão as férias escolares, boa parte dos professores igualmente gozam de repouso, inicia – se o período da alta estação turística, a cidade fica cheia de gente de toda a parte do país e do mundo, as temperaturas são gélidas atraindo ainda mais gente para a festa da literatura. Um bom período para escritores profissionais, amadores, apenas amantes da escrita, fazedores de fanzines, de literatura de cordel, artistas mambembes, saltimbancos, de comerciante de todo o tipo em busca de uma grande oportunidade de fazer negócio e de hippies, artistas de rua, exporem seus trabalhos criativos, já que a atmosfera assim o permite.

Caetano saiu de sua provinciana e pacata cidade em busca de uma vida menos miserável, sem controle por parte dos pais há quatro anos atrás vivendo em cada lugar, cada um de cada vez sem rumo definido, sem teto, abrigo, tendo apenas e tão somente o céu por companhia, sua mochila com poucas peças de roupa, seu alicate para fazer suas peças artesanais, sua faquinha amolada e um feixe de palhas de coqueiro embaixo dos braços. Aprendeu na rua e com outros artesãos o oficio de confeccionar arte a partir das palhas de coqueiro. Rapidamente, enquanto se aproxima das mesas de bar faze uma flor, um besouro, um beija-flor. Assim, de bar em bar, de besouro em besouro consegue o sustento do dia acreditando que a liberdade não imposta da moral e dos bons costumes é um preço que poucos estão dispostos a pagar, consequentemente, a comprarem suas próprias liberdades, ainda que em função do outro, já que sem troca da arte pelo casual de uma mesa de bar não há como contrapor liberdade e fruição corriqueira. 

Naquele ano Caetano decidiu conhecer a cidade da festa literária. Ouvira dizer que gente descolada de toda a parte do país e até de outros lugares do mundo para lá vão em busca de troca de informações, cultura, respirar um ar diferente de gente disposta a se colocar nas páginas dos livros, tanto autobiográfica quanto escrevendo biografias. 

Na segunda noite de festa, depois do estômago bater-lhe as entranhas, de apertar mais o cinto da calça já esquálida, decidiu se aproximar de um grupo de pessoas bebendo cachaça ouvindo uma apresentação de Jongo, exatamente nas pedras daquela cidade histórica que outrora viu os calos dos escravos e suas costas sofrerem os açoites para as gentes brancas passarem por sobre seus suores e sangues se misturando à argamassa de areia, óleo de baleia, conchas trituradas do mar, logo ali, no caís do porto guardado pela igrejinha e pelos barcos atracados na rampa de acesso, donde também se pode avistar a curvatura das montanhas repletas de relva da floresta da mata atlântica que, de tão verde, se mistura à esmeraldina cor da água do mar. 

Fazia frio. Muito frio. À medida que se aproxima das pessoas em volta da roda de Jongo procurava feito um telescópio a quem se aprumar. Viu de longe uma linda mulher, tímida, vestida num longo colorido, brioso, de contorno de sua silhueta magra, esguia, lânguida, fendida à altura da panturrilha mostrando parte de suas pernas grossas, encostando na sandália de couro, trançando uma fitilha colorida por entre o dedo maior separando-o dos demais dedos do pé. Seu cabelo meio encaracolado vinha até a altura dos ombros e do meio da cabeça uma tiara também colorida estampada deixava à vista seu rosto simétrico, lindo, coberto por um sorriso tímido e um olhar de soslaio, envergonhado, ainda que não parasse de olhar para ele. Ele, inerte, sem saber o que fazer, pela primeira vez ficou atônito e com medo de qualquer aproximação. Ainda assim, depois de tantas trocas de olhares sem nenhum esboço de ação por parte dele decidiu puxar sua faquinha amolada, apanhar um punhado de palha de coqueiro e, à medida que tecia sua arte olhava-a para não perder de vista e continuar acreditando no que se passava. Tomou coragem, olhou para o céu e disse consigo que aquela era a hora ou nunca. Se aproximou dela e deu-lhe uma rosa. Ela sorriu e envergonhada olhou para baixo dando para perceber seu rosto ruborizado. Silêncio. Nem mesmo os batuques dos tambores quebrava a afonia angustiante daquele momento. Ela então se aproximou dele e num sotaque desconcertante disse-lhe:

_ “bamos fumar una marijuana”?

Caetano então tomou-lhe pelo braço e a levou para um lugar reservado. Ela que possuía uns “beques”, uns cigarrinhos de maconha enrolados na bolsinha de tirinha que carregava, acendeu um e começaram a fumar vendo a festa ao longe, a lua por testemunha, o reflexo da luz na água, o som dos tambores e sorveram o delírio daquele momento.  

 Logo 大麻, que os chineses chamavam de Má (caminho da produção de fumo) de origem variada e difusa, ilava aqueles dois estranhos numa situação no mínimo inusitada. Talvez inebriados pelo efeito da cannabis, talvez pelo inusitado do momento, ela decidiu perguntar pelo nome dele:

_ Su nombre?

_ Matraca, ele respondeu, em referência à sua alcunha recebido exatamente por falar demais. 

_. No, no, su nombre miesmo

_ Caetano. 

Começaram a se beijar ardentemente, ele então passou as mãos nas suas costas, sentir seu hálito, passou as mãos na cabeça, nos seus cabelos, agarrando seu rosto e olhando pelo reflexo da luz da lua o fundo dos seus olhos. Ficaram muito tempo assim. Ela então perguntou se ele tinha fome fazendo mimica com as mãos contraindo os dedos contra a palma na altura da boca e acenando para o estômago. Ele respondeu que sim. Ela o tomou pelas mãos e o arrastou até o centro da cidade pedindo que ele escolhesse em qual restaurante queria comer. Andando de mãos dadas com aquela beldade se lembrara dos augúrios que passou na vida e até mesmo das humilhações porque passou naquela mesma cidade semanas antes da festa literária, quando, pedindo um prato de comida foi enxotado como um cachorro vira lata sem dono. Andando de mãos dadas com ela, estufando o peito, altaneiro, sorridente, se sentiu valorizado e respeitado. Escolheu exatamente o mesmo restaurante que na semana anterior tinha sido expulso, na verdade enxotado rua afora. Comeu feito um rei. Bebeu vinho, riu de suas não palavras, da falta de comunicação, de não saber dizer alguma palavra que expressasse o que sentia. Só sabiam se olhar e rir despudoradamente. 

Depois de um jantar à luz de velas, vinho, um peixe ligeiramente temperado com ervas mediterrânicas, resolverem absortamente de mãos dadas andarem a esmo pela cidade apenas se entreolhando. Ele; com um sorriso incontido não cabendo em si; Ela, feliz, leve, apreciando cada minuto sem a preocupação de explicar nada a ninguém e nem de dar satisfação a quem quer que seja. Resolverem se refugiar no mesmo local onde, ele, todas as noites, se aninha, mesmo com o frio, dormir. Não dormiram. Caetano delicadamente tirou a alça do vestido que cobria seus seios rosados, pequenos e pontiagudos, passou as mãos com quem acaricia um bibelô pela primeira vez. Despiu-a toda, viu a barriga delgada, arrancou-lhe a calcinha vendo o monte de Vênus raspado, lindo, passando ligeiramente os dedos no seu sexo quente e molhado. Ela estava encharcada de tanto prazer. Passando a língua em todo o seu corpo imaginou como nos dias em que sentado à beira da praia vê os ricos deslizarem com suas pranchas amarradas por uma corda sendo puxados por barcos brancos e caros, assim, era a língua de Caetano a roçar no mar daquela linda mulher. Seu sexo duro e riste a penetrou lentamente. Ela deu um gemido frêmito de prazer e começou a arranhar as costas dele sem dizer uma única palavra. Ele queria ficar horas dentro dela, e ficou. Depois de tanto sexo ela se virou de lado e dormiu. Ele, com as mãos embaixo da cabeça olhava o céu estrelado e as pequenas nuvens de frio por sobre eles carregando os ventos da noite nada veloz. Começou a indagar o sentido de tudo aquilo. Ao perceber que caíra num profundo sono, abriu a carteira dela a procura dos seus documentos. Com a escuridão da noite, mesmo com o reflexo da luz viu apenas o primeiro nome e não consegui ler os demais: Marie.... Não consegue ver o local de nascimento. Pensara não se tratar de uma assassina, de uma serial killer ou de alguém que, aproveitando-se de sua condição econômica queria tão somente se aproveitar. Se deu conta de que pessoas que querem apenas se aproveitar não tratam o outro tão bem, com tanto carinho, desprendimento, sem pedir nada em troca, a não ser a companhia. É que ao longo de sua jornada nunca havia sido tratado com tanta delicadeza. De tanta felicidade, dormiu. E sonhou.

Ao amanhecer percebeu que Marie não estava ao seu lado, havia saído e deixado apenas a canga onde dormiram. O peso dos corpos ainda desenhava as silhuetas na canga por sobre a areia, era ali, um corpo ausente demarcando um corpo que queria se fazer presente, era a ausência do presente, um olhar para o peso sobre a canga que não queria ver, e sim, o corpo que havia desenhado tal silhueta na areia. Se levantou e em pé começou a procurá-la achando que estivesse à beira-mar. Nada. Esperou por horas na esperança de que ela voltasse, achando que havia se perdido no caminho da padaria para comprar um pouco de café, pão e leite... Mas nada. Nenhum sinal dela. Esperou por ela até a tarde quanto enfim se deu conta de que havia ido embora sem nenhum adeus. A noite anterior havia sido a mais feliz de toda a sua vida, dia do seu 23º aniversário. 

Se levantou, pegou sua mochila e decidiu ir embora daquela carregando a única coisa dela que a possuía, a canga, além das lembranças.

No ano seguinte, exatamente uma semana antes da festa da literatura, Caetano estava de volta aquela mesma cidade. Durante todas as noites a procurou insistentemente, seu vestido, sua sandália, sua silhueta. Todas às vezes que via alguém parecido seu coração acelerava, saia em disparada na esperança de a encontrar. Em vão. A festa terminou e ele andava com a canga na mão. Decidiu voltar ao lugar onde havia feito amor, deitou a canga, olhou para o céu e jurou nunca mais voltar ali.    
                                             

Entrevista com Arton, de Sirius. Parte II

  Entrevista realizada no dia 14 de fevereiro de 2024, às 20:00, com duração de 1': 32'', gravada em um aparelho Motorola one zo...